– Allan, posso pedir rescisão indireta por desvio de função?
Sim, o desvio de função gera rescisão indireta.
Se você faz tarefas de outra função, diferente daquela para a qual você foi contratado, isso gera rescisão indireta.
Sabe qual o problema?
Identificar exatamente quando uma situação é considerada desvio de função para a Justiça.
Aqui, além de te explicar isso, vou te mostrar como a rescisão indireta por desvio de função funciona e como dar entrada.
Vamos para o conteúdo? 👇
1 – Posso Pedir Rescisão Indireta Por Desvio De Função?
Sim, você pode pedir a rescisão indireta por desvio de função.
Isso está previsto no artigo 483 da CLT, especificamente na alínea “a”, que diz:
Art. 483 – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
[…]
A parte importante aqui é o termo “alheios ao contrato”.
O que a CLT está dizendo é que, se a empresa cobra serviços não previstos no contrato, você pode exigir sua rescisão indireta.
Para a Justiça do Trabalho, isso é um assunto delicado…
Nem sempre a Justiça reconhece os casos de desvio de função.
Na verdade, a maioria dos casos são desfavoráveis.
Quando A Justiça Do Trabalho Reconhece O Desvio De Função?
Para a Justiça do Trabalho, o desvio de função acontece quando você é contratado para um cargo, mas realiza todas as tarefas de outro cargo, de forma permanente.
Não é uma simples ajuda em outra área ou uma atividade isolada.
É como se a empresa tivesse transferido suas responsabilidades para outro cargo, sem formalizar a mudança ou ajustar o salário correspondente.
✍️ Exemplo:
Imagine que você foi contratado como zelador, mas passa a exercer a função de encarregado.
Suas atividades são:
- Organizar equipes;
- Aplicar advertências;
- Representar a empresa em processos administrativos.
Segundo a CBO (Classificação Brasileira de Ocupações), estas são as atividades de um Zelador:
Zelam pela segurança das pessoas e do patrimônio de edifícios de apartamentos, edifícios comerciais, igrejas e outros. Atendem e controlam a movimentação de pessoas e veículos no estacionamento; recebem objetos, mercadorias, materiais, equipamentos; conduzem o elevador, realizam pequenos reparos, prestam assistência aos religiosos, ornamentam a igreja e preparam vestes litúrgicas.
Bem diferente o que deveria fazer com o que você faz, concorda?
Nesse caso, você não está apenas ajudando em uma tarefa fora do padrão.
Você está desempenhando um trabalho completamente diferente daquele para o qual foi contratado.
Para a Justiça reconhecer o desvio de função, é necessário:
- Provar a mudança permanente de função;
- Mostrar incompatibilidade com o cargo original;
- Comprovar prejuízo financeiro.
Muita gente acaba perdendo esse tipo de processo por não ter provas suficientes. E, na prática, muitos acreditam que sofreram desvio de função quando, na verdade, não aconteceu.
Isso se dá pelo fato de que pouca gente entende quando realmente acontece o desvio de função.
Desvio de Função NÃO é Desvio de Tarefa!
Isso mesmo, desvio de tarefa não tem nada a ver com desvio de função.
Se você faz uma ou outra tarefa de outro cargo, isso não é desvio de função – é desvio de tarefa.
O desvio de função acontece quando você realiza todas as tarefas de outro cargo. E mais: precisa ser de forma contínua e habitual.
Um dos inscritos do Canal do GE no YouTube compartilhou esta dúvida:

Esse é um ótimo exemplo de como muita gente confunde desvio de função com desvio de tarefa.
Pense bem: será que um jardineiro só corta grama com a roçadeira?
Claro que não!
O cargo envolve muitas outras atividades.
No caso descrito, o porteiro faz apenas uma tarefa do jardineiro, uma vez por mês.
Isso não é suficiente para termos um desvio de função.
Para a Justiça do Trabalho, o desvio de função só ocorre quando você executa todas as tarefas de outro cargo, como se estivesse ocupando o cargo de fato, mas sem o devido reconhecimento.
2 – Como Funciona a Rescisão Indireta por Desvio de Função?
A rescisão indireta funciona como um botão de emergência, que você aperta quando a empresa comete uma falta grave!
Falta grave, Allan?
Sim, algo de errado, como, por exemplo, exigir o desvio de função.
O artigo 483 da CLT lista vários tipos de faltas graves que justificam a rescisão indireta.
Mas, aqui, o nosso foco é o desvio de função.
Se quiser conferir outras faltas graves que justificam a rescisão indireta, confere:
Certo, mas como a Rescisão Indireta por Desvio de Função acontece, NA PRÁTICA?
Primeiro, entenda: você vai precisar colocar a empresa na Justiça.
Quem declara a sua rescisão indireta é o Juiz do Trabalho, após avaliar se o desvio de função realmente aconteceu.
Você só vai pedir; a decisão final é dele.
Ou seja, o Juiz vai avaliar se realmente aconteceu o desvio de função.
Ao apertar esse botão da rescisão indireta, você tem duas opções:
1️⃣ Continuar trabalhando normalmente enquanto espera a decisão do Juiz.
2️⃣ Parar de trabalhar e aguardar a decisão – mas, nesse caso, você não receberá salário até a decisão final.
Reforçando: você vai pedir para a Justiça para encerrar o seu contrato.
Se o Juiz reconhecer a rescisão indireta, isso significa que:
- Seu contrato será encerrado;
- A empresa será obrigada a te pagar todos os direitos rescisórios, como FGTS com multa de 40% e seguro-desemprego.
Mas atenção: se você perder a rescisão indireta, as consequências mudam:
- Se parou de trabalhar, será como se você tivesse pedido demissão, sem direito a verbas rescisórias completas.
- Se continuou trabalhando, nada acontece, e você pode seguir no emprego.
Basicamente, a rescisão indireta por desvio de função é uma válvula de escape para o trabalhador que não quer ficar preso a um contrato injusto.
3 – Passo a Passo para Pedir Rescisão Indireta por Desvio de Função
Está sofrendo desvio de função e quer pedir a rescisão indireta?
Então siga estes passos:
- Confirmar a falta grave;
- Reunir provas;
- Decidir sobre a continuidade do serviço;
- Contratar um advogado;
- Entrar com o processo.
A seguir, detalho cada um deles.
1º Passo: Você Realmente Está Sofrendo Desvio de Função?!
O primeiro passo é entender se o que está acontecendo no seu trabalho é, de fato, um desvio de função.
Para conseguir a rescisão indireta, você precisa comprovar na Justiça que está passando por isso.
Como mencionei no tópico 1, muita gente se confunde em relação ao que realmente é desvio de função.
Se você perceber que não está sofrendo desvio de função, nem tudo está perdido.
Existem outras coisas que podem levar à rescisão indireta.
Falei sobre elas aqui:
⚠️ Lembre-se:
Desvio de função é quando você realiza todas as tarefas de outro cargo de forma habitual, como se estivesse ocupando essa posição oficialmente – mas sem o salário ou reconhecimento devido.
2º Passo: Reunindo as Provas do Desvio de Função
Após confirmar que está enfrentando um desvio de função, é hora de reunir as provas.
Sem elas, você não tem nada.
Na Justiça, é sua responsabilidade demonstrar que está fazendo tarefas de outro cargo de forma habitual e sem o devido reconhecimento.
Não adianta só dizer: “estou sofrendo desvio de função, todo mundo sabe”.
Isso não é suficiente.
Você precisa de provas fortes que mostrem que foi contratado para uma função e está realizando outra completamente diferente.
A forma mais fácil de provar desvio de função é com testemunhas.
Pessoas que trabalharam com você e possam confirmar como era seu dia a dia.
Você também pode utilizar conversas de WhatsApp, capturas de tela ou áudios.
Outra coisa que você pode fazer é tirar fotos e filmar você realizando a função desviada.
3º Passo: Decida se Vai Continuar Trabalhando ou Não
Após reunir suas provas, você precisa tomar uma decisão importante:
Vai continuar trabalhando enquanto espera o resultado da rescisão indireta ou vai parar de trabalhar?
A lei permite que você escolha, mas cada opção tem suas consequências.
1️⃣ Se optar por continuar trabalhando:
- Você mantém seu salário enquanto o processo está em andamento.
- No entanto, pode ser desgastante permanecer em um ambiente onde a relação com a empresa já está fragilizada.
2️⃣ Se optar por parar de trabalhar:
- Você reforça o argumento de que a situação é insustentável.
- No entanto, ficará sem salário até que o Juiz tome uma decisão.
Essa decisão precisa ser muito bem planejada.
Analise suas condições financeiras e, se possível, converse com um advogado para entender qual opção faz mais sentido no seu caso.
⚠️ Atenção:
Se você decidir parar de trabalhar e o Juiz não reconhecer a rescisão indireta, isso será considerado como um pedido de demissão. Nesse caso, você perde o direito a verbas como o FGTS e a multa de 40%.
4º Passo: Avalie Contratar um Advogado Trabalhista
Eu já disse aqui no Blog que você não precisa contratar um advogado para rescisão indireta.
Mas como tudo na vida, essa escolha tem prós e contras.
Eu separei as principais coisas que você precisa considerar:
Vantagens de não contratar um advogado:
✅ Economia: você não terá custos com honorários advocatícios.
✅ Autonomia: pode dar entrada no processo diretamente no Fórum Trabalhista da sua cidade.
✅ Praticidade em cidades menores: se a sua cidade tem poucos advogados trabalhistas, evitará a dificuldade de encontrar um especialista.
Problemas de não contratar um advogado:
❌ Incerteza sobre as provas: sem orientação técnica, pode ser mais difícil organizar e apresentar as provas corretamente.
❌ Risco de perder direitos: advogados experientes podem identificar direitos que você não sabia que tinha. Ao entrar sozinho, você arrisca deixar algo importante de fora.
❌ Dificuldade nas audiências: participar sozinho de audiências pode ser complicado e causar nervosismo, especialmente em situações de confronto com a empresa.
Na minha opinião, o que eu recomendo é que você se faça a seguinte pergunta:
Estou disposto a receber menos do que tenho direito e a arriscar perder essa Ação?
Se a resposta for sim, recomendo que você não contrate um advogado.
Em processos simples, que não vão impactar sua vida, essa decisão faz sentido.
Só preciso alertar sobre a questão das provas.
Realmente é bem delicado provar o desvio de função, então seria interessante pelo menos fazer uma consulta com um advogado ou pedir ajuda ao seu Sindicato.
⚠️ Dica prática:
Se optar por contratar um advogado, pesquise bem antes de escolher.
Verifique a experiência dele com casos trabalhistas, leia avaliações de outros clientes e converse sobre suas expectativas antes de tomar uma decisão.
📌Advogado para rescisão indireta: passo a passo de como escolher com segurança (na prática)
5º Passo: Entre com o Processo de Rescisão Indireta
Agora que você já decidiu sobre contratar um advogado e reuniu todas as provas, é hora de dar entrada no processo.
Como você viu, pode entrar sozinho ou com ajuda de um advogado.
O caminho será diferente, dependendo da sua escolha.
1️⃣ Entrando Com a Rescisão Indireta Por Desvio de Função Sem Advogado:
Se optar por dar entrada sozinho, siga este passo a passo:
- Organize todas as provas que reuniu, como documentos, mensagens e depoimentos.
- Escreva, de forma clara, a sua história: o que aconteceu, quando começou o desvio de função, como ele acontece e como isso te prejudicou.
- Vá até o Fórum Trabalhista da sua cidade com sua carteira de trabalho, documentos pessoais e as provas.
- Explique que deseja entrar com uma ação de rescisão indireta.
Alguns Tribunais permitem que você dê entrada no processo pela internet.
Consulte o site do Tribunal da sua região para verificar essa possibilidade.
2️⃣ Entrando Com a Rescisão Indireta Por Desvio de Função Com Advogado:
Se você escolheu contratar um advogado, o processo será mais simples.
- Envie todas as provas e informações ao seu advogado.
- Ele vai organizar os documentos, preparar a petição inicial e dar entrada no processo para você.
- Você só precisará acompanhar o andamento da ação e comparecer às audiências, se necessário.
Cuidado na escolha do seu advogado. Ela é determinante para você ganhar ou não. Por isso, pesquise bastante antes de decidir.
📌Advogado para rescisão indireta: passo a passo de como escolher com segurança (na prática)
4 – Conclusão
Pedir a rescisão indireta por desvio de função pode parecer complicado, mas agora você já sabe exatamente como fazer.
Desde entender se está realmente sofrendo desvio de função até reunir provas e dar entrada no processo, cada passo é essencial para garantir seus direitos trabalhistas.
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